Depois de beirar máximas históricas na bolsa de Chicago e bater recorde no Brasil, as cotações do milho começaram a dar sinais de acomodação. Mas, de acordo com especialistas consultados pelo Valor, mesmo com a correção as cotações deverão permanecer mais elevadas do que no ano passado, em média. Esse cenário continua a preocupar a indústria de aves e suínos – dependente do cereal para a produção de rações para os animais -, que pressiona o governo por mais medidas para baratear o insumo.

 

Em Chicago, os contratos futuros do milho estão em trajetória descendente desde o fim da primeira quinzena deste mês. “O clima é favorável nos Estados Unidos, e o plantio da nova safra [2021/22] está praticamente finalizado dentro da janela ideal, o que deixa a situação confortável”, diz Vlamir Brandalizze, analista da Brandalizze Consulting.

 

Embora já tenham recuado 14,85% em maio, para US$ 5,7325 por bushel, os contratos de segunda posição de entrega do milho ainda acumula valorizações de 18,62% neste ano e de 77,48% nos últimos 12 meses até sexta-feira – na semana anterior, a alta em 12 meses chegou a superar 100%.

 

“Em três anos, este pode ser o primeiro em que exista mais oferta que consumo. Por isso que o patamar caiu de US$ 7 o bushel, e a tendência é ficar entre US$ 5 e US$ 6”, afirma Brandalizze, reforçando que qualquer evento climático pode alterar este cenário.

 

Esse arrefecimento da alta no exterior, contudo, foi limitado no Brasil. O dólar em torno de R$ 5 mantém a paridade de importação muito alta. Um exemplo é o Indicador Esalq/BM&FBovespa, que subiu mais de 4% em um mês, com a saca de 60 quilos cotada a R$ 101,93 – no dia 18 de maio, o índice atingiu o maior valor da história (R$ 103,23 por saca). Nas praças monitoradas pela consultoria StoneX, o cereal mostra tendência de queda em maio, sendo a mais expressiva em Maringá (PR), de 8,4%, de R$ 107 para R$ 98 por saca de 60 quilos na última sexta-feira.

 

João Pedro Lopes, analista da StoneX, disse que a baixa deve continuar limitada pelo câmbio. Atualmente, segundo operadores, o cereal brasileiro é o mais caro do mercado, se considerado só o custo por tonelada. Isso sinaliza que indústrias e criadores pagam mais para manter o milho no Brasil, e importar não tem sido opção. “O custo logístico é alto e, às vezes, nem é possível”.

 

 

Neste cenário, compradores se retraem à espera da segunda safra brasileira. Porém, esta sofre seguidos cortes nas estimativas de produção em função do atraso da semeadura e do tempo seco em importantes áreas produtoras. “O atraso no plantio alongou a entressafra e criou um ambiente de preocupação”, diz Paulo Molinari, analista da Safras & Mercado.

 

Ademais, mais da metade da safrinha já foi negociada, segundo a StoneX, e o produtor está confortável para negociar o que resta.

 

Com margens apertadas e temendo serem considerados “vilões” da inflação, produtores de aves e suínos pedem ao governo federal medidas que deixem o milho mais barato. A única veio em abril, com a retirada da Tarifa Externa Comum (TEC) para o cereal importado de fora do Mercosul. A intenção era que a notícia segurasse as cotações, mas Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), reconhece que a iniciativa não surtiu efeito. “O cenário piorou”.

 

O dirigente diz que o segmento pediu um pacote de medidas que ainda não foi atendido pelo governo, como isenção de PIS/Cofins e do Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) sobre o cereal que vem de fora do país.

 

A ABPA quer também a liberação da importação de variedades transgênicas dos EUA que não são autorizadas no país, para que possam vir exclusivamente para ração – demanda que existe desde 2016 junto à Comissão Técnica Nacional de Biotecnologia (CTNBio). “Precisa haver uma ação governamental, senão essa alta vai acabar na mesa do consumidor”, conclui Santin.

Fonte: Valor