Os preços do arroz atingiram níveis recorde em 2020, mas, com vendas que ocorreram antes de a disparada começar, poucos produtores conseguiram de fato embolsar o aumento. O cereal não deverá retornar aos picos registrados no ano passado, segundo as projeções de momento. Ainda assim, é com preços menores que os de 2020 que os agricultores deverão ter ganhos mais robustos na atual temporada.

 

No Brasil, a colheita concentra-se entre fevereiro e março. Quando ela começou no ano passado, o preço da saca de arroz (base casca) de 50 quilos estava pouco acima de R$ 40, menos da metade do valor praticado no fim da segunda semana de 2021, de R$ 90,31, de acordo com o indicador Cepea-Senar/RS.

 

“Esse é o primeiro ano em que muitos produtores vão vender, já na arrancada, em um patamar de preço tão elevado”, diz Alexandre Velho, presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz). Em 2020, afirma, menos de 20% dos agricultores aproveitaram o ‘boom’ dos preços.

 

A alta das cotações do arroz em 2020 não ocorreu apenas no Brasil, e o quadro atual reforça as perspectivas de preços firmes. Antes da pandemia, a tonelada FOB do arroz estava pouco acima de US$ 400 na Tailândia, maior produtor global; pouco depois, em abril, o preço já estava em US$ 559. Neste mês de janeiro, a tonelada está próxima de US$ 520.

 

Se as previsões se concretizarem, o cenário será de “início de recuperação” no campo, diz Velho. Mas esse fôlego não deve estimular o aumento de área plantada no país, ao menos por ora. O dirigente acredita que serão necessários alguns anos de preços elevados para ampliação de área – atualmente de 1,7 milhão de hectares – e reversão de problemas estruturais, como o endividamento, preocupação de longa data dos orizicultores.

 

Em 2021, as variações de cotação tendem a ser menores que as do ano passado, avalia Carlos Cogo, da Cogo Consultoria. “O preço médio será menor que em 2020, mas muito maior que a média histórica”, afirmou.

 

Ele acha que não há elementos que indiquem recuo dos preços para níveis abaixo de R$ 80, muito menos para perto dos R$ 40 do início da colheita passada. Por outro lado, não há indicação de que retornem aos recordes de R$ 120 por saca, ainda que possam voltar aos três dígitos, diz Cogo.

 

Segundo o consultor, os preços no varejo devem variar entre R$ 3 e R$ 3,50 o quilo. O valor é inferior ao dos picos que assustaram os consumidores em 2020, mas está acima dos R$ 2,60 do período pré-pandemia.

 

Os estoques em baixa e a oferta apertada ajudam a manter os preços em alta. Segundo os cálculos da Federarroz, a próxima colheita nacional deverá ficar entre 10,5 e 10,9 milhões de toneladas – o resultado depende da área final colhida, já que algumas lavouras foram abandonadas. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima colheita de 10,9 milhões de toneladas para 2021.

 

“O ajuste dos preços é necessário. Ele é para o bem da própria cadeia produtiva”, afirma Andressa Silva, diretora-executiva da Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz).

 

A derrubada da Tarifa Externa Comum (TEC), de setembro a dezembro, criou um teto nos preços, estabilizou o mercado e evitou qualquer risco de desabastecimento interno, explica a executiva. As importações do cereal no período somaram 348 mil toneladas; a cota era de 400 mil toneladas.

 

Um navio tailandês com 30 mil toneladas ainda deve desembarcar no Brasil em breve, mesmo sem conseguir aproveitar a isenção do imposto. Em todo o ano de 2020, entraram no Brasil 1,2 milhão de toneladas, maior volume dos últimos 17 anos.

 

A indústria descartou pedir a renovação da isenção para importação do produto de fora do Mercosul e acredita na oferta regular de arroz até o meio do ano. “Teremos que ver qual será o comportamento dos preços depois de agosto”, completou a executiva.

 

Se preços elevados e remuneradores são uma certeza para 2021, o setor ainda tem vários pontos de interrogação. Clima, câmbio e consumo são os fatores que concentram a atenção de produtores e indústrias.

 

O fim do auxílio emergencial, por exemplo, pode estimular a compra de produtos básicos como o arroz – e o aumento da demanda na pandemia, que ocorreu após a estiagem do ano anterior causar uma quebra de safra, foi um dos elementos por trás dos preços recorde de 2020. A indefinição sobre a volta às aulas presenciais também. No ano passado, a média de consumo de arroz subiu 5%, para 33,3 quilos per capita, ou 11 milhões de toneladas.

Fonte: Valor