Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

 

As relações econômicas da China com o resto do mundo estão mais ou menos equilibradas, segundo afirmou ontem o Fundo Monetário Internacional (FMI) – uma mudança significativa após anos de críticas de outros países de que a China representava um risco para a economia mundial.

De acordo com o FMI, o superávit em conta corrente do país caiu para perto de zero pela primeira vez desde 2012, quando o Fundo começou a informar os desequilíbrios que afligem as grandes economias mundiais.

Em 2018, o superávit em conta corrente da China caiu 1 ponto percentual sobre o ano anterior, para 0,4% do PIB, segundo o FMI. A “posição externa” da China está em “ampla consonância” com “os fundamentos de médio prazo e políticas desejáveis”, diz o Fundo.

Durante anos, a conta corrente da China mostrou o país como um grande emprestador líquido para o mundo, apresentando um superávit de até 10% do PIB, como em 2007. Mas nos últimos anos, sua economia se tornou progressivamente mais dependente da demanda doméstica – em vez das exportações e dos investimentos externos – e isso ajudou a reequilibrar sua posição comercial.

“Obviamente ainda há muito a ser feito, mas é importante reconhecer que algumas coisas foram feitas, incluindo a maior flexibilidade cambial e a menor dependência da demanda externa”, disse ao “Financial Times” Gita Gopinath, economista-chefe do FMI. “Queremos que a China se volte mais para o crescimento orientado pelo consumo, sendo ao mesmo tempo cuidadosa com o aumento dos riscos financeiros.”

Zhan Jun, diretor da Faculdade de Economia da Fudan University de Xangai, diz que essa tendência deverá prosseguir. “A política mostra claramente que a China vai acelerar a abertura do mercado doméstico e aumentar as importações”, afirma ele, acrescentando que déficits em conta corrente são possíveis no futuro, em razão do crescimento acelerado da importação de serviços, dos quais os gastos de turistas são o maior componente. “O comércio de mercadorias não vem sendo capaz de criar um superávit para compensar o déficit do comércio de serviços”, diz Zhang.

No entanto, alguns economistas acreditam que o superávit em conta corrente da China poderá aumentar novamente, porque alguns dos fatores motivadores da queda, como o estímulo fiscal recente, poderão desaparecer.

A virtual eliminação do superávit em conta corrente da China significa que os desequilíbrios comerciais estão agora em sua maioria concentrados nas economias avançadas, segundo o FMI.

Os superávits e déficits em conta corrente responderam por cerca de 3% do PIB mundial em 2018, metade do nível de 6% verificado em 2007, mas só um pouco menor que a parcela de 3,5% de 2013.

A zona do euro teve um superávit em conta corrente de 2,9% do PIB em 2018, um pouco menor que o de 2017, com o superávit da Alemanha caindo de 8% para 7,3%. Apesar da melhora, o FMI ainda julga a posição externa da Alemanha como “substancialmente mais forte” que os fundamentos e pediu a Berlim uma “política fiscal orientada para o crescimento”.

O déficit em conta corrente dos EUA permaneceu inalterado em 2,3% do PIB, o que se traduziu em uma posição externa “moderadamente mais fraca”, segundo o FMI. Isso sugere que os EUA precisam de uma consolidação fiscal, de reformas estruturais e remover as tarifas impostas recentemente. O Fundo também disse que o déficit em conta corrente do Reino Unido se deteriorou no ano passado, de 3,3% para 3,9%, e deverá piorar mais para 4,2% do PIB neste ano.

O FMI alertou que os países não deveriam se render à tentação de usar medidas protecionistas de comércio para reduzir desequilíbrios e conta corrente, uma vez que essas políticas podem dar errado. “Nossa posição é, e tem sido, a de que as tarifas não resolvem desequilíbrios, e sim ocorrem à custa do crescimento doméstico e global”, disse Gopinath. “Isso não significa que não haja preocupações legítimas com o sistema de comércio multilateral, que terão de ser enfrentadas para uma resolução durável das tensões comerciais.”

Na semana que vem, o FMI vai atualizar sua previsão de crescimento global, que atualmente aponta para uma expansão de 3,3% neste ano, com uma aceleração para 3,6% em 2020.

No relatório divulgado na terça-feira, o FMI disse que o mundo poderá esperar um impacto no crescimento de até 0,3% do PIB no ano que vem, por causa das tarifas anunciadas recentemente pelos EUA sobre os produtos chineses. Isso se acrescenta ao impacto de 0,2% sobre o PIB global provocado pelas tarifas do ano passado.

Fonte: Valor