Terceiro maior produtor agrícola do mundo, atrás apenas da União Europeia e dos EUA, o Brasil elevou em 78% sua produção em uma década, com acréscimo de apenas 16,3% da área plantada. Apoiado em pesquisa e tecnologia, o setor tem conseguido ganhos de produtividade e de mercado no exterior, diferentemente de outros segmentos da economia. Para o pesquisador Marcos Sawaya Jank, o momento atual do agronegócio brasileiro pode ser comparado a um “bilhete premiado”. “Existe uma demanda muito grande, e não só na China”, afirma o professor do Insper. Puxadas pela venda de milho, algodão e carne, as exportações devem atingir neste ano 200 milhões de toneladas, 5% mais do que em 2018, apesar da persistência de gargalos como a logística.

 

O produtor rural Frederick Wolters, descendente de holandeses que deixaram a Europa para se aventurar na lavoura no Brasil, aponta o milharal que mancha de verde as terras vermelhas de Itararé, interior de São Paulo. Quase 80% das 180 toneladas de milho que espera colher nesta safra vão ficar ali mesmo, alimentando mais de 20 mil suínos da granja na fazenda Agropecuária Ponte Alta.

 

Ele não esconde o entusiasmo com o bom momento de dois importantes negócios da propriedade, com a valorização do milho e da carne suína. “É o momento de recuperar os anos difíceis e de guardar dinheiro para o futuro.” Ele é um dos beneficiários do cenário que levará o agronegócio brasileiro a bater mais um recorde. As exportações, puxadas pelo milho, algodão e carne, devem atingir 200 milhões de toneladas, alta de mais de 5% ante 2018. Em dez anos, o aumento supera os 70%.

 

A cada ano, o agronegócio se consolida como um dos pilares da economia brasileira. Apoiado em pesquisa e tecnologia, o setor tem elevado de forma consistente sua produtividade e ganhado mercado mundo afora, o que não ocorre com outros segmentos. Dados da consultoria MB Agro mostram que, na safra 2008/09, a produção foi de 135 milhões de toneladas de grãos, para uma área plantada de 42,79 milhões de hectares. Na safra 2018/19, a área plantada subiu 16,3%, para 49,7 milhões de hectares, enquanto a produção teve salto maior, de 78%, para mais de 240 milhões de toneladas.

 

“Da porteira para dentro (ou seja, sem considerar a logística, ainda um gargalo no País), a agricultura avança pela combinação de fatores que vão do uso intenso de tecnologia, de manejo e melhoria genética ao controle de pragas”, diz José Carlos Hausknecht, sócio da MB Agro. “E o Brasil ainda conta com fenômeno que não ocorre em países do Hemisfério Norte, que é ter mais de uma safra por ano, por causa do clima favorável.”

 

Segundo João Martins, presidente da Confederação Nacional da Agricultura, a perspectiva para 2020 também é positiva. A produção recorde de grãos deste ano, acima de 240 milhões de toneladas, deve subir mais em 2020. A projeção da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é de alta de 6,4%. O Brasil é o terceiro maior produtor agrícola mundial, atrás de União Europeia e EUA e à frente da China.

 

Queda na soja. Curiosamente, esse bom desempenho do agronegócio em 2019 vem a despeito do que ocorre com a soja, principal produto agrícola nacional e carro-chefe das exportações. O grão teve vendas e preços prejudicados pelos atritos comerciais entre EUA e China, diz a pesquisadora do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da USP (Cepea/Esalq), Andréia Adami.

 

“O volume total embarcado foi maior por causa das vendas de carnes, milho, algodão, etanol, café e frutas, mas os produtos do complexo soja e o açúcar tiveram seus embarques reduzidos em 2019”, diz Andréia. A exportação de soja foi 12% menor. Essa queda na venda e no preço faz com que, em receita, as exportações fiquem menores em relação a 2018 – um recuo de US$ 101 bilhões para US$ 96 bilhões. Mesmo assim, a soja segue como principal item das exportações

 

“O Brasil conta com fenômeno que não ocorre em países do Hemisfério Norte, que é ter mais de uma safra por ano, por causa do clima favorável.” José Carlos Hausknecht SÓCIO DA MB AGRO brasileiras, devendo atingir receita de US$ 32,2 bilhões.

 

Neste ano, o milho foi o produto com maior alta na exportação em valor (123%) e em volume (130%). A produção, superior a 100 milhões de toneladas, e a quebra na safra americana favoreceram a venda. O País é o terceiro maior produtor de milho e o segundo maior exportador.

 

Em volume, o algodão (86% de aumento) e o café (11,3%) também foram destaque, informa o Agrostat Brasil, sistema de dados do governo federal. A alta na venda de carne bovina de 10% e de frango in natura de 9% também foram decisivas.

 

A valorização das carnes foi importante para melhorar o desempenho do agronegócio em 2019, segundo o Cepea/Esalq. Uma das causas do desempenho é a demanda maior provocada pela peste suína em países asiáticos desde setembro de 2018. A exportação de bovinos aumentou 9,3%, e o preço da arroba do boi atingiu patamares históricos. Em 27 de novembro chegou a R$ 231, nível nunca antes alcançado. Como efeito, houve impacto no varejo. Sem a pressão da carne, o IPCA de novembro – que registrou alta de 0,51% – teria ficado em 0,30%.

 

Na carne suína, a situação é semelhante. Wolters reconhece que a suinocultura vive momento de euforia, com o preço do suíno vivo em torno de R$ 6 o quilo, custo de R$ 4,40 e margem de lucro líquida de até 20%.

 

“Estamos em processo de recuperação, após anos difíceis. Há um ano vendíamos suíno a R$ 4,15 o quilo. O milho estava em R$ 31 a saca e hoje está em R$ 45”, diz ele. “Nossa expectativa é reduzir ao máximo a tomada de capital de giro, investir na fábrica de ração e ter sobra para o giro quando ficar difícil outra vez.”

 

 

Fonte: Correio do Povo