Em cumprimento ao artigo 195 da Constituição Federal, a primeira parte do projeto de reforma tributária proposta pelo Ministério da Economia concedeu tratamento diferenciado ao regime agrícola. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia afirmado, em diversas ocasiões, que pretende acabar com benefícios fiscais, mas por questões técnicas e constitucionais, o projeto de lei entregue ao Congresso Nacional nesta terça-feira, 21, apresentou exceções.

 

“Em vez de mandarmos uma PEC [Proposta de Emenda à Constituição], já havendo [PEC] 45 na Câmara e a [PEC] 110 no Senado, mandamos propostas que podem ser trabalhadas e acopladas. Mas mandaremos todas as propostas do governo: imposto de renda, dividendos, IPIs; todos os impostos serão abordados”, declarou Guedes, na saída do gabinete do presidente do Senado, Davi Alcolumbre.

 

A proposta entregue pelo governo — e registrada no Congresso como projeto de lei 3887 de 2020 — propõe a extinção dos impostos PIS e Cofins para que seja criada a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS). O tributo teria alíquota geral e fixa de 12% e caráter não-cumulativo.

 

Isso significa que o recolhimento do tributo deve ser feito fornecedor de bens ou serviços. Mas, ao vender esse bem ou serviço, o fornecedor deve adicionar o custo do tributo ao valor de venda da mercadoria. Dessa forma, o consumidor paga pelo imposto já recolhido ao governo federal, o que resulta na geração de créditos. A ideia do Ministério da Economia é que ao fim de três meses-calendário, as empresas possam usar os créditos no abatimento de outros impostos federais ou, então, solicitar o ressarcimento da quantia.

 

O CBS deve incidir sobre pessoas jurídicas e plataformas mediadoras de comércio digital. No caso das plataformas, também conhecidas como marketplaces, a tributação deve ser feita quando o vendedor for uma pessoa física que não emite nota fiscal sobre a operação de venda.

 

“Se você é uma indústria, um comércio ou um setor de serviços, você vai pegar todo o conjunto das notas fiscais das suas compras e pregar do lado esquerdo da sua parede. No fim do mês, você vai pegar todas as suas notas fiscais de venda e vai pregar do lado direito da parede. Some as notas fiscais de venda, veja quanto tem de tributo a pagar. Some as notas fiscais de compra, veja quanto de tributo já foi pago nessas compras e confronte um com o outro, resultando num tributo a pagar”, detalhou a assessora especial do ministro Paulo Guedes, Vanessa Rahal Canado.

 

No regime agrícola, para não haver cumulatividade — já que produtores rurais são pessoas físicas — quem adquirir produtos agropecuários in natura ou contratar transportadores autônomos poderá calcular e se apropriar do crédito presumido.

 

O projeto ainda prevê isenção para todas as mercadorias exportadas e para os produtos listados na Nomenclatura Comum do Mercosul entre os capítulos 1 e 12. Entre eles estão soja, trigo, milho, hortaliças, peixes, carnes e animais vivos. Os produtos que fazem parte da cesta básica também receberam isenção. Porém, esse benefício deve ser perdido na próxima proposta a ser entregue pelo Executivo.

 

Canado explicou que a arrecadação obtida pela oneração da cesta básica será utilizada no programa de transferência de renda que tem sido desenvolvido pelo governo Bolsonaro. O chamado Renda Brasil deve ser criado a partir da extinção do Bolsa Família.

 

“Nessa primeira fase, a gente não mexeu na isenção dos tributos da cesta básica exatamente para que esse programa seja desenhado junto com o programa de transferência de renda ou Renda Brasil ou qualquer que seja que ainda vai ser apresentado e discutido pelo ministério. Tudo está bastante amadurecido e pronto com relação à oneração da cesta básica, o quanto esse valor poderia trazer de recursos e a alocação, eventualmente, desses valores no programa de transferência  de renda, para que você, por meio desse programa de transferência de renda, possa compensar as famílias mais pobres pelo imposto sobre consumo embutido nos alimentos ou qualquer serviço que elas consumam”, expôs.

 

Neste primeiro momento, as importações de produtos da cesta básica também permaneceriam isentos. Além disso, algumas pessoas jurídicas também devem contar com a tributação zero. É o caso das cooperativas. Operações entre cooperativas e seus associados não seriam taxados com o CBS. Sindicatos, templos religiosos e instituições filantrópicas também estão entre os beneficiados.

 

Próximos passos da reforma tributária

O secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes, anunciou que o Ministério da Economia tem realizado reuniões com estados e entidades que representam municípios para debater a reforma de tributos regionais. A pasta pretende chegar a um consenso com os entes federativos sobre as mudanças a serem feitas no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto Sobre Serviços (ISS).

 

Tostes informou que o ministério tem tratado uma agenda de sete eixos com os governos estaduais. Entre eles, está a demanda dos estados da criação de um fundo de desenvolvimento regional, que substitua incentivos fiscais do ICMS, e a criação de outro fundo de compensação das exportações.

 

O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que tem arrecadação federal ficou de fora dessa primeira proposta, mas deve ser contemplado no segundo projeto da equipe econômica.

 

“O governo vai mandar, nas próximas semanas, uma reforma que simplifique o IPI e, portanto, deixe o IPI muito mais com características de um tributo seletivo no sentido da literatura internacional. Não como a gente tem hoje de que seria um tributo seletivo que está subjetivo: o que se acha essencial tem alíquota menor, o que se acha menos essencial tem alíquota maior. Não é essa a ideia. A ideia é transformá-lo em um excise tax. Que é taxar mais os produtos que causem externalidades negativas, trazem danos ou custos extras à sociedade”, antecipou Canado.

Fonte: Canal Rural