Expectativa de alta de juros no Plano Safra
O governo federal vai anunciar amanhã, no Palácio do Planalto, o Plano Safra 2021/22, e a expectativa é de elevação nos juros para o financiamento dos produtores. A alta nos custos de produção, reflexo do dólar valorizado nos preços dos insumos, e o apetite aberto para investimentos – efeito de recorde de colheitas, exportações e cotações de commodities nesta temporada – vão forçar um aumento no volume de recursos ofertados para o crédito rural. Que virá mais “verde”, com foco na produção sustentável, e terá mais incentivos para armazenagem e inovação.
Embora a expectativa de aumento dos juros tenha se acentuado nas últimas semanas, algumas das principais lideranças do agronegócio ainda vislumbram uma possível manutenção das taxas, mesmo com a forte alta da Selic, que está hoje em 4,25%, dois pontos percentuais acima do nível de um ano atrás. Essa elevação encareceu os empréstimos – os juros variaram de 2,75% a 6% na temporada que está chegando ao fim – e vai exigir mais recursos para a equalização das operações subsidiadas, mas esbarra na dificuldade fiscal do caixa da União.
O fechamento dos detalhes do plano depende da decisão sobre o valor para bancar a subvenção dos financiamentos. A definição, que deverá ocorrer nesta segunda-feira, vai abrir caminho para a votação das regras em reunião extraordinária do Conselho Monetário Nacional (CMN).
O pedido da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, foi de R$ 15 bilhões, e ela está confiante em conseguir pelo menos R$ 13 bilhões. Nas negociações com o ministro da Economia, Paulo Guedes, Tereza Cristina contou com o apoio do presidente da República. “Estou arranjando para ela mais R$ 500 milhões para o Plano Safra”, afirmou Jair Bolsonaro a apoiadores na quinta-feira.
O Plano Safra 2020/21 teve R$ 236,3 bilhões, com R$ 33 bilhões para o Pronaf (agricultura familiar) e R$ 33,2 bilhões para o Pronamp (médios produtores). Do total, R$ 154,3 bilhões foram com juros controlados, sendo que R$ 89,8 bilhões tiveram subvenção e foram inteiramente consumidos.
Com o esgotamento precoce dos recursos, deverá haver uma corrida ainda mais acelerada pelos empréstimos com equalização a partir de julho. A expectativa é que o governo destine mais recursos para os pequenos produtores – diferentemente da safra atual, quando aplicou 57% dos R$ 11,5 bilhões em operações de médios e grandes produtores. Haverá ainda uma atualização nos limites do Pronamp, de R$ 2 milhões para R$ 2,5 milhões de renda bruta anual dos beneficiários para enquadramento, o que poderá ampliar o alcance do programa.
“É muito pouco provável que os juros sejam mantidos. A questão não é se vão subir, mas para quanto”, afirmou Antonio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). O governo deverá adotar o discurso de que as taxas serão “fixadas em níveis que não comprometem a capacidade de pagamento do produtor rural”.
Mesmo com aumento, o plano poderá ser mais competitivo que o atual para os produtores, já que uma alta mais forte nos juros também é descartada. Para os pequenos produtores, as alíquotas poderão voltar a ficar abaixo da Selic. “Se o governo quiser manter a mesma área financiada, precisamos de mais recursos, e não se pode elevar os juros da agricultura familiar nesse momento”, afirmou o presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), Carlos Joel da Silva.
“Quando a Selic caiu para 2%, a queda nos juros do Plano Safra não foi proporcional. Então espero que não suba tanto agora”, complementou Antonio da Luz.
Há quem acredite que o governo redobrará seus esforços para evitar os efeitos políticos negativos do aumento das taxas. Tereza Cristina deixará a Agricultura em abril de 2022 para concorrer nas eleições, e este será o último Plano Safra anunciado pela ministra. A corrida eleitoral também interessa a Bolsonaro, que quer demonstrar que prestigia um dos setores mais fiéis de sua base de apoio.
O volume total de recursos para contratação também deverá aumentar, já que algumas fontes de captação (depósitos à vista e poupança rural) cresceram cerca de 20%. Uma novidade será a participação de mais bancos na operacionalização dos recursos equalizados com a abertura total feita pela Lei do Agro. Ao menos dez instituições apresentaram propostas, entre elas a Caixa, bancos de montadoras de máquinas agrícolas e um privado – além de Banrisul e BRDE, que estrearam em 2020/21.
A maior concorrência pode “calibrar melhor” o spread bancário e começar a reduzir custos na ponta. Os agentes estreantes deverão priorizar a aplicação dos recursos equalizados em operações de investimentos, que aumentaram quase 50% nesta safra.
O governo também quer abrir espaço a novos mecanismos de crédito, como os Fundos de Investimentos nas Cadeias Agroindustriais (Fiagro), às Cédulas de Produto Rural (CPR) e à expansão dos recursos livres nas contratações de crédito rural, que devem fluir, mas com uma dose adicional de dificuldade devido ao cenário de alta nos juros de longo prazo.
Fonte: Valor