O setor da soja talvez viva um dos momentos mais espetaculares de sua história em 2020. Além de colher a maior safra de todos os tempos e, de quebra, se tornar o maior produtor mundial do grão, os produtores viram os preços da saca atingirem patamares inéditos, bem acima dos R$ 100. Mas será que isso vai continuar em 2021? Durante a Abertura Nacional do Plantio da Soja, em Capinópolis (MG), especialistas analisaram as possibilidades para o próximo ano.

 

Segundo o analista de mercado da Safras & Mercado, Luiz Fernando Gutierrez, um dos principais influenciadores para a formação dos preços será o clima, mesmo que indiretamente. A meteorologia, aliás, foi o assunto mais comentado no evento, pois com a confirmação do La Niña, parte do país e de seus concorrentes podem ter problemas.

 

Clima X preços

O meteorologista da Somar, Celso Oliveira, confirmou que o La Niña tende a diminuir as chuvas para uma grande região produtora de soja do país, o Sul. Além de trazer impactos diretos no clima da Argentina.

 

“Se olharmos para a Argentina, independente da época, seja tanto na primavera, como no verão, a perspectiva é de chuvas normais ou um pouco abaixo da média. Isso não significa falta de chuvas, mas ela será irregular. Então dependerá dessa chuva coincidir com as fases da lavouras que precisarão mais de umidade. Se elas faltarem nas fases críticas, como começo ou enchimento de grãos, ai sim o país pode ter problemas produtivos”, afirmou o meteorologista.

 

Nos Estados Unidos a situação é parecida, só que os problemas podem acontecer durante a colheita.

 

“Nos Estados Unidos a colheita da soja começou e, por enquanto, a perspectiva é boa, pois não há previsão de chuvas volumosas por lá. Mas se o produtor instalou a lavoura mais tarde por lá, ai pode haver complicação, pois ele não terá umidade boa. En as temperaturas tendem a ser mais elevadas daqui para frente”, diz.

 

Mercado em 2020

Segundo o analista da Safras & Mercado, essa questão climática já teve influência sobre a safra dos Estados Unidos e em breve o mercado começará a olhar para a América do Sul

 

“Conforme a colheita nos EUA for terminando, o mercado voltará a olhar para a América do Sul. Com o La Nina, a tendência é de problemas nessa parte Sul do Brasil e na Argentina. Se isso acontecer começaremos a ver os efeitos na Bolsa de Chicago já a partir de novembro”, comenta ele.

 

O Brasil já negociou mais da metade da safra segundo levantamento da consultoria. Isso representa 55% do total que será colhido, um volume recorde para o período, que na média seria 25%.

“Os produtores aproveitaram os altos preços para vender. Esses valores são sustentados hoje por Chicago, que está um pouco mais elevado, também os prêmios pagos para a safra nova que já supera os 60 pontos sobre Chicago”, diz Gutierrez.

 

Segundo ele, daqui para a frente a comercialização perderá um pouco de ritmo, não só pelo volume já negociado, mas também porque os produtores irão focar no plantio. “Também deve interferir nas novas vendas o risco climático, que segura o ímpeto de se adiantar tanto”, diz.

 

Para o restante de 2020 a tendência é de preços em alta, afirma Gutierrez, até porque o país não tem mais soja para vender, emenda.

 

“Inclusive o país está importando muita soja, podendo fechar o ano com o maior patamar desde 2003. Isso mostra que o mercado interno está brigando para ter o restante dessa soja e pagando alto por isso”, conclui.

 

Preços para 2021

Se existe uma dúvida em relação aos preços, essa certamente se refere aos patamares que irão atingir em 2021, quando a safra de soja plantada nesta quinta-feira, será colhida.

 

“Para falar de preços para o próximo ano temos que ter uma ideia de quanto vamos colher. No próximo ano a questão da oferta de grão irá explicar os preços, pois a tendência é ter mais grão, mesmo com quebra no Brasil, então talvez eu não apostaria em preços tão altos quanto agora”, diz Gutierrez.

 

Ele comenta que as negociações antecipadas trouxeram um pouco de alívio em relação a 2021 e que por isso, parte deles esteja mais atento ao plantio do que a comercialização agora.

 

“A parte da comercialização está mais tranquila agora para os produtores, que devem voltar suas atenções para a parte do campo e do clima. Essa forte antecipação minimizou os riscos de mercado”, afirma o analista.

 

O presidente da Aprosoja Brasil, Bartolomeu Braz, reiterou a informação que as vendas antecipadas estão bastante a frente do normal e que outras questões preocupam as lideranças do setor da soja e do agronegócio.

 

“As vendas de fato estão aceleradas e os produtores seguem travando negócios, pois há chance de as reformas propostas pelo governo não serem aprovadas e o dólar voltar a cair, atrapalhando as vendas na hora da colheita”, diz ele.

 

Política e economia

Para o professor de economia da Universidade de São Paulo (USP), Celso Grisi, as dúvidas do presidente da Aprosoja tem muito fundamento.

 

“O cenário político é de muitas incertezas mesmo e isso traz reflexos para a economia também. Isso fez com que o dólar subisse bastante no Brasil, já que a situação aqui é mais complicada, piorada pela pandemia. Prevejo que para 2021 o dólar entrará em queda, chegando a patamares entre R$ 4,30 e R$ 4,90”, afirma.

 

Segundo o professor, é consenso entre vários especialistas do país que as taxas de dólar para 2021 podem recuar.

 

“Claro que isso deve diminuir a rentabilidade atual que a soja tem trazido. A produção mundial está em crescimento, estoques relativamente mais baixos que o normal e um apetite chines ainda bastante grande pelo grão. Com isso tudo, acredito que os preços da soja tendem a recuar algo entre 10% a 15% em 2021. Por isso aconselho a todos os produtores que antecipassem suas negociações”, diz Grisi.

Fonte: Canal Rural